O REI MAU E O PROFETA DESTEMIDO!

22/04/2012 11:43

Texto: Mateus 14. 1-14.

 

Introdução

 

     É comum escutarmos reprimendas e exortações dirigidas aos pobres e humildes, mas quantas vezes ouvimos os soberanos acusados de seus pecados e crimes? O texto descreve um pregador que não temia condenar as transgressões dos poderosos. A pregação de João Batista não era menos rigorosa para os que ocupavam posições elevadas. O corajoso profeta teria dito em uníssono com o Salmista: “Também falarei dos teus testemunhos perante os reis, e não me envergonharei” (Sl 119. 46).

 

I -  Herodes Escuta João

 

     Herodes Antipas foi um dos filhos de Herodes Magno, que regia toda a Palestina quando Cristo nasceu. Morrendo o pai, tornou-se soberano da Galiléia e da Pérsia. É chamado tetrarca (de uma palavra que significa “quatro”) porque o reino original era dividido em quatro partes.

     Os Herodes mantinham seu trono pelo favor dos romanos. Os judeus não simpatizavam muito com eles, por descenderem dos edomitas e por causa da sua ferocidade e traição. Herodes, no entanto, alegava fidelidade à religião judaica e por isso mandou chamar João Batista, para fazê-lo pregador da corte. “Porque Herodes temia a João, sabendo que era varão justo e santo; e guardava-o com segurança, e fazia muitas coisas, atendendo-o, e de boa vontade o ouvia” (Mc 6. 20). A consciência perturbada de Herodes pode ter-lhe disposto a escutar o pregador. O tetrarca desejava paz de espírito.

 

II – Herodes Lança João no Cárcere

 

     Herodes correspondia, em vários aspectos da sua vida, à pregação de João Batista, porém numa coisa não iria ceder – em desmanchar seu  casamento ilícito com Herodias. Herodes casara-se com a filha de Aretas, um chefe árabe, união que garantia a paz entre as raças árabes e o país de Herodes; agradou-se o imperador de Roma, e talvez Herodes tivesse um lar feliz. Certo dia, porém, visitou Roma, onde vivia seu irmão, Filipe. A mulher de Filipe e Herodes passaram a compartilhar uma união adúltera, e ela deixou Roma para viver com ele. A filha de Aretas voltou à casa do pai.

     Um homem menos consciencioso evitaria atacar a ilícita união daquele homem poderoso. João Batista, porém, não conciliava meios-termos à sua vocação de profeta. Dissera abertamente ao rei: “Não te é lícito possuí-la”. Não iria ele alterar a lei de Deus para agradar ao rei.

     A Herodes, dói-lhe ser tocado naquele ponto sensível da consciência. Herodias, qual onça furiosa, valeu-se da sua vontade de ferro para persuadir o soberano a prender a João. Josefo, o historiador judeu que viveu no período da destruição de Jerusalém, fala muito bem de João e declara ter sido preso por motivos políticos: Herodes temia que sua popularidade provocasse uma rebelião. Sabe-se pela Bíblia que Herodes tinha semelhantes temores quanto à influência de Jesus (Lc 13. 31-33).

     Considerações políticas podem ter pesado na prisão de João Batista, mas Josefo ignorava as razões pessoais. Podemos imaginar Herodias, irada, insuflando Herodes: Lembre-se de que sua posição depende das boas graças dos romanos. Este profeta, pregando acerca da vinda do Messias e seu reino, acenderá as chamas da revolta entre o povo; e quando isso acontecer, você estará politicamente arruinado”.

     Humanamente falando, João atingira o auge do sucesso: fora convidado a pregar diante do soberano de duas províncias, o rei Herodes. Era de fato grande honra, mas havia por detrás do convite uma sutil tentação. Mas nisso, deu o profeta o exemplo às igrejas. O sucesso dos vendedores de mercadorias está em oferecer aquilo que o público deseja; a igreja, por outro lado, somente alcançará sucesso se oferecer ao povo o que ele precisa.

 

III – Herodes Executa João

 

     Herodes festejava seu aniversário. Suntuoso banquete foi servido aos nobres, oficiais e políticos de maior destaque da Galiléia. O vinho fluía livremente, e os ilustres convidados já estavam alegres. Entre eles, Salomé, sobrinha do monarca e descendente de uma antiga linhagem de reis judeus. Era exímia dançarina. E, por certo, atendia sugestão da mãe ao fazer uma exibição de natureza provavelmente vulgar, algo indigno para uma moça hebréia e inconcebível a uma princesa. Vasti, a rainha persa, recusou-se, mesmo custando-lhe a coroa, comparecer a um banquete dessa natureza. A ação de herodias, em permitir a exibição da filha, revela cínico desrespeito ao pudor e ausência de afeição natural.

     A exibição de Salomé seguiram-se estrondosos aplausos. Herodes ficou felicíssimo com a recepção favorável dos hóspedes e, inflamado com o vinho, “prometeu com juramento dar-lhe tudo o que pedisse”. Após consultar a mãe, a moça voltou com o pedido: “Dá-me aqui num prato a cabeça de João Batista”. Era uma das formas adotadas pelos poderosos para mostrar sua satisfação com a vingança obtida. Conta-se que o general romano Marco Antônio mandava trazer as cabeças dos inimigos à mesa das refeições, divertindo-se em olhar para elas enquanto comia.

 

  1. Ser triste não basta. “E o rei afligiu-se”. Voltaram-lhe a lembrança da popularidade de João e a antiga reverência que sentia pelo profeta. A consciência o torturava. A tristeza em nada o ajudou, porque não foi seguida de arrependimento nem da decisão de evitar o mal.

 

 

  1. Dignidade própria não é boa plataforma. A segunda consideração que jazia no caminho da consciência do rei era a presença dos convidados, que lhe dificultava uma evasiva.

 

IV – A Má Consciência de Herodes

 

  1. Um pregador muito antigo. “E chegaram os seus discípulos, e levaram o corpo, e o sepultaram; e foram anunciá-lo a Jesus”. Para o rei Herodes, o assunto de João Batista ainda não acabara. Pesava-lhe a consciência e, na sua imaginação, via os olhos penetrantes e o dedo acusador do profeta; uma voz parecia gritar-lhe constantemente: “Adúltero! Assassino!” Ao ouvir falar do ministério poderoso de Jesus, um calafrio de medo percorreu-lhe o corpo.

 

     Talvez Herodes, no início, se parabenizasse: Bem, fiquei livre de um pregador impertinente. João era um homem bom, porém intrometia-se demais na minha vida particular.

     Nos primeiros dias do cristianismo, muitos dos que zombavam do Evangelho eram presas fáceis de charlatões que fingiam praticar magia. Hoje, pessoas que se consideram intelectualmente avançadas para praticar a "religião dos crentes" acabam vítimas de seitas satânicas, magia e sortilégios. A descrença, apesar da sua jactância, nem sempre anda à luz da razão. A rejeição a Cristo, em muitos casos, deixa as pessoas abertas à ilusão. O caminho de escape à supertição é a fé cristã.

     Anos mais tarde, Pilatos enviou Jesus a Herodes, para que este o interrogasse. Herodes esperava uma demonstração de milagres, mas nada lhe foi concedido presenciar: "E interrogava-o com muitas palavras, mas ele nada lhe respondia" (Lc 23. 9).

     "Se eu atender à iniquidade no meu coração, o Senhor não me ouvirá" (Sl 66. 18). Enquanto soar a voz em nossa consciência: Não te é lícito!", como poderemos esperar resposta às nossas orações?